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Apr 7, 2021 - 5 minute read

TC considerou ilegais alterações ao regimento da Assembleia da Madeira no âmbito da pandemia

O Tribunal Constitucional (TC) declarou a ilegalidade das alterações feitas ao regimento do parlamento da Madeira em abril do ano passado, relativas ao número de deputados necessários ao seu funcionamento, no âmbito da pandemia da covid-19. Em abril de 2020, uma resolução da Assembleia Legislativa Regional (ALR), aprovada por PSD e CDS-PP, determinou que este órgão só poderia funcionar “em reunião plenária achando-se presente, pelo menos, um terço do número de deputados em efetividade de funções”.

No entanto, o TC considerou esta alteração ao regimento ilegal, já que o Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira (EPARAM) define, no artigo 52.º, que “a Assembleia Legislativa Regional se considera constituída em reunião plenária encontrando-se presente a maioria dos seus membros”.

“Ora, confrontando-se a norma fiscalizada com a norma paramétrica do EPARAM, não pode deixar de concluir-se que aquela é ilegal, visto que admite o funcionamento do órgão com a presença de apenas um terço dos deputados em efetividade de funções”, lê-se no acórdão disponível na página da internet do TC, com a data de 24 de março.

Os juízes do Palácio Ratton decidiram também declarar a ilegalidade, igualmente com força obrigatória geral, de outra alteração realizada ao regimento do parlamento regional, segundo a qual, conjugados dois artigos, “[a]s deliberações sem eficácia externa, tomadas sobre aspetos circunscritos à coordenação de trabalhos ou seus procedimentos, são válidas achando-se presente, pelo menos, um terço dos deputados em efetividade de funções”.

“A incompatibilidade desta norma com o artigo 52.º do EPARAM é evidente. Se a reunião plenária não pode ter-se por constituída sem a presença da maioria legal dos seus membros, não pode haver lugar a deliberação. Podendo ser mais exigente do que o quórum de funcionamento, o quórum deliberativo não pode, pela natureza das coisas, ser menos exigente do que aquele”, lê-se na decisão.

Assim, sublinha o TC, “declarando-se a ilegalidade de ambas as normas com fundamento na violação de estatuto da região autónoma, torna-se dispensável a apreciação dos pedidos de declaração de inconstitucionalidade”.

Outra das questões levantadas por deputados da oposição (PS, JPP e PCP) no parlamento regional, onde PSD e CDS (partidos que formam a coligação de Governo Regional) têm maioria absoluta, está relacionada com a possibilidade de, “não se encontrando presentes todos os deputados em efetividade de funções”, os votos expressos serem “contados como representando o universo do respetivo grupo parlamentar”.

Este ponto foi depois alterado com uma nova revisão do regimento aprovada em julho, passando a ter a seguinte redação: “Os votos expressos pelos deputados presentes serão contados como representando o universo do respetivo grupo parlamentar, desde que estejam presentes mais de dois terços dos deputados de cada grupo parlamentar”.

Ou seja, passou, assim, a ser impossível que “o voto de um único deputado” fosse “imputado a todos os deputados que integram o mesmo grupo, como sucedia com a norma antes vigente”.

Tendo em conta que a norma em relação à qual tinha sido feito o pedido de verificação de constitucionalidade, o Tribunal Constitucional foi verificar se a norma revogada produziu efeitos jurídicos constitucionalmente relevantes durante a sua vigência.

“Sucede que o sistema de contagem de votos estabelecido pela norma sindicada não foi aplicado em todas as deliberações aprovadas nesse período. Com efeito, a eventual declaração de inconstitucionalidade ou ilegalidade não atingiria a regularidade daquelas deliberações, que foram tomadas por unanimidade ou sem votos contra”, lê-se no acórdão.

O TC conclui, consultado o Diário da ALRAM, que “a eventual declaração de inconstitucionalidade ou ilegalidade poderia ter efeitos em 24 deliberações”.

“Mesmo no que respeita a estas deliberações, a eventual declaração de inconstitucionalidade ou de ilegalidade […] não prejudicaria necessariamente a regularidade da sua aprovação”, consideram os juízes, não se pronunciando sobre a inconstitucionalidade da norma.

Contactado pela Lusa, o presidente da Assembleia Legislativa da Madeira, José Manuel Rodrigues (CDS-PP), sublinhou que a decisão do TC “era previsível”, se bem que “está ultrapassada no tempo”.

“Uma vez que as normas pelas quais o Tribunal [Constitucional] se pronunciou já estão sanadas com uma outra revisão regimental que, em boa hora, o PSD e o CDS procederam, depois dos protestos dos partidos da oposição”, disse à agência Lusa.

José Manuel Rodrigues lembrou que, na altura, alertou a maioria no parlamento insular para a “possibilidade de haver uma ilegalidade”, como, salientou, “se veio a verificar”.

“Portanto, a decisão era previsível, está em consonância com o Estatuto Político-Administrativo, está ultrapassada no tempo, com o bom senso da maioria, que demonstrou em função de um erro que tinha cometido e fez bem em ter recuado”, reiterou.

O centrista lembrou que a alteração inicial ao regimento foi feita por causa da pandemia de covid-19, tendo surgido “a necessidade de criar um conjunto de condições para o funcionamento” do parlamento, com a maioria PSD/CDS-PP a entender que “poderia haver um quórum de funcionamento mais ligeiro do que a maioria mais um dos deputados”.

“Foi nessa base que fez uma revisão regimental e, meses depois, veio a recuar, dando razão a quem dizia que havia uma possível ilegalidade e mesmo inconstitucionalidade”, reforçou.

A Assembleia Legislativa da Madeira é composta por 47 deputados, sendo 21 do PSD e três do CDS-PP, que apoiam o executivo.

O PS é o maior partido da oposição, tendo uma bancada com 19 deputados. O JPP tem três parlamentares e o PCP um.