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Mar 22, 2021 - 5 minute read

Investigadora escocesa estuda riscos para espécies no mar da Madeira

Ashlie McIvor é natural da Escócia e, já depois de ter concluído o seu mestrado na Arábia Saudita, instalou-se na Madeira em janeiro deste ano para dar início a uma nova aventura, investigando a variabilidade oceânica e a influência da pressão humana. Para além dos vários tons de verde que pintam as encostas madeirenses, uma cor nunca falta na paleta do arquipélago: o azul vibrante das suas águas cristalinas que são a casa de muitas espécies marinhas. Mas o oceano que abraça a ilha tem muito mais para contar e há ainda questões por responder relativamente ao ecossistema e aos desafios que estes animais marinhos enfrentam na Região. Ashlie McIvor é precisamente uma das investigadoras que neste momento procura dar respostas a algumas lacunas que o conhecimento científico ainda apresenta.

Natural da Escócia e já depois de ter concluído o seu mestrado na Arábia Saudita, esta cientista instalou-se na Madeira em janeiro deste ano para dar início a uma nova aventura. Tudo começou em janeiro de 2020 quando Ashlie se candidatou ao programa de bolsas de doutoramento da Fundación “La Caixa”. Em julho descobriu que era uma dos 65 selecionados e recebeu um financiamento de 115 mil euros que a trouxe até à Madeira para desenvolver este estudo, proposto pelo polo local da MARE (Centro de Ciências do Mar e do Ambiente) e pela ARDITI (Agência Regional para o Desenvolvimento da Investigação, Tecnologia e Inovação), as suas instituições de acolhimento, na sequência das investigações que desenvolvem nesta área.

Ao JM, Ashlie McIvor desvendou um pouco da sua investigação, que terá a duração de três anos. “O grande objetivo é olhar para como a variabilidade oceânica e a pressão humana afetam e alteram a distribuição e a presença dos predadores de topo que temos aqui, que são os animais que estão no topo da cadeira alimentar, como baleias, golfinhos, focas, mas também peixes, como o atum, tubarões…”, explicou a estudante, realçando, no entanto, que ainda está numa fase inicial do seu trabalho, pelo que só mais tarde conseguirá apontar as questões específicas e as zonas madeirenses sobre as quais se irá debruçar mais a fundo.

“Vou passar algum tempo aqui na ilha principal, mas talvez também vá às outras, dependendo das questões que surgirem ao longo do meu doutoramento”, acrescentou.

Por agora, a investigadora de 25 anos está mergulhada na imensidão da literatura científica acerca destes predadores e a desenhar a sua estratégia metodológica, esperando, no entanto, arrancar em breve com o trabalho de campo.

Já Ana Dinis, investigadora no MARE-ARDITI e uma das coordenadoras de Ashlie, esclarece que o estudo desta jovem cientista se distingue dos demais devido às particularidades das águas madeirenses. “Esta é uma ilha oceânica, em águas profundas. Não são águas costeiras que já sabemos que estão sob grande pressão. A Madeira é um excelente laboratório ao vivo e temos aqui a oportunidade para estudar águas oceânicas que de alguma forma podemos pensar que são imaculadas e em que a pressão é menor, mas às vezes podem não ser assim e temos de investigar um pouco mais. Mesmo que estejamos no meio do oceano, a ilha tem população e existem algumas pressões que estes animais enfrentam mesmo nestas áreas remotas”, disse.

Entre os riscos que a fauna marinha podem correr, como o barulho, tráfego marinho e a poluição, Ashlie McIvor escolheu dedicar-se ao estudo do impacto do lixo, como plásticos e detritos flutuantes. “Vou quantificar o lixo que existe aqui e comparar com alguns dos dados já existentes, o que pode adicionar conhecimento ao que já sabemos acerca dos riscos que estas espécies podem enfrentar nestas águas”, apontou.

Tal investigação permitirá, nomeadamente, verificar se existem áreas de grande densidade de lixo marinho e se estas coincidem com áreas importantes para estes predadores. Além do mais, em última instância, este projeto poderá ainda contribuir para a consciencialização dos perigos e da necessidade de alterar alguns comportamentos da população, de modo a garantir a preservação destas espécies.

Já questionada sobre se o turismo que vive da observação destes animais representa uma ameaça, a investigadora realçou que na verdade estes profissionais podem ser uma mais valia para o seu projeto. “Acho que tê-los é um grande trunfo, no sentido em que são uma fonte adicional de dados e de informação”, reiterou.

Pelo seu lado, Ana Dinis afirma que no que diz respeito a estas atividades “a Madeira é um muito bom exemplo de boas práticas, porque temos legislação em vigor que é muitas vezes melhor do que em várias partes do mundo”. “As autoridades e o governo atuaram numa fase muito inicial, por isso estas atividades não crescem nos dias de hoje sem vigilância”, frisou.

Quanto à sua estadia na Madeira, Ashlie McIvor mostrou-se entusiasmada e diz ter-se sentido bem-vinda, destacado em especial o ambiente colaborativo e o dinamismo que encontrou neste centro de investigação madeirense, um facto também assinalado por Ana Dinis, que reconheceu que esta investigação “não é trabalho para uma só pessoa”.

“Até agora a minha experiência tem sido ótima. Não tenho nada a reclamar. Na Escócia podia reclamar do tempo, mas penso que não posso fazer isso cá. O mesmo com a Arábia Saudita, porque às vezes estava muito calor ou havia tempestades de areia. Mas é completamente diferente por causa da covid, porque nem todos estão no escritório. Conhecemo-nos todos online, mas acho que tem resultado bem. Senti-me muito bem-recebida e tem tudo corrido bem”, disse, contando que já teve a oportunidade de participar em trabalhos de campo de outros colegas.

De apontar que, para além da orientação científica dos investigadores João Canning-Clode e Ana Dinis da MARE-ARDITI e de Miguel Pais da MARE-Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, Ashlie McIvor vai contar ainda com o apoio e cooperação do Instituto das Florestas e Conservação da Natureza, da Estação de Biologia Marinha e da Direção Regional do Mar.

Ashlie McIvor licenciou-se em Ciências Marinhas na University of Highlands and Island, na Escócia, tendo depois se aventurado no departamento de Ciências do Mar da Universidade de Ciência e Tecnologia KingAbdullah (KAUST), na Arábia Saudita, onde concluiu o seu mestrado, em 2020. A jovem investigadora possui ainda licença para pilotar barcos a motor, formação em primeiros socorros a mamíferos marinhos e já realizou duas expedições científicas.