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Apr 7, 2021 - 4 minute read

Governo recorre da decisão dos 5% de IRS reclamados por municípios

O Governo Regional decidiu interpor um recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul da decisão de primeira instância tomada pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal, que, em fevereiro último, condenou a Região Autónoma da Madeira no pagamento de 9,1 milhões de euros, correspondentes aos 5% do IRS de sete municípios da Região, designadamente Funchal, Porto Moniz, Machico, Santa Cruz, Santana, São Vicente e Porto Santo. O recurso interposto a 16 de março último tem efeitos suspensivos sobre a decisão do tribunal do Funchal, pelo que o Governo Regional não terá de devolver qualquer montante enquanto a questão estiver a ser dirimida judicialmente. A contenda entre as autarquias e o Governo Regional tem mais de uma década. Iniciou-se em 2009, quando Miguel Albuquerque era presidente da Câmara Municipal do Funchal e Alberto João Jardim chefiava do Governo. Porém, na altura a ação judicial não foi contra o Governo Regional, como entretanto se tornou, mas contra o Governo da República. A Madeira acabou por perder esse processo quatro anos mais tarde, com a decisão final do Tribunal Constitucional.
Em 2014, já com várias alterações políticas desencadeadas pelas eleições autárquicas, um grupo de municípios fez nova investida para reclamar os 5% do IVA de 2009 e 2010, mas agora contra o Governo da República e contra o Governo Regional. O Governo da República acabou sendo retirado da contenda, por decisão judicial, e ficou apenas o executivo madeirense, que já este ano perdeu a ação no tribunal do Funchal. É precisamente esta última decisão que agora o Governo Regional veio contestar em segunda instância. De acordo com as alegações de recurso a que o JM teve acesso, a Região Autónoma da Madeira, representada pelo Governo Regional, entende que não existe “base legal” para ser condenada no referido pagamento, pois a “Lei das Finanças Locais (LFL) impõe obrigação de pagamento ao Estado”, as “Leis dos Orçamentos do Estado de 2009 e 2020 impõem obrigação de pagamento ao Estado” e ainda a “Lei de Finanças Regionais garante receitas fiscais das Regiões”. A Madeira argumenta, por outro lado, que teria de haver alteração legislativa ou de decreto legislativo regional específico para obrigar ao cumprimento desse pagamento, o que não aconteceu. Para a defesa, a questão está também ferida de “inconstitucionalidade e ilegalidade qualificada” da Lei de Finanças Locais e das Leis dos Orçamentos do Estado de 2009 e 2010, “se interpretados no sentido de o pagamento dever ser efetuado pela RAM, por violação do princípio da autonomia regional e de leis de valor reforçado”. A Região alega, ainda, haver a “confiança e segurança legítimas derivadas da conduta adotada pelo Estado/Governo a assumir a plena responsabilidade pelo pagamento”. Em declarações ao JM, o vice-presidente do Governo Regional sublinhou que “nunca foi uma promessa do Governo Regional passar esses valores” da participação variável até 5% de IRS para os municípios, e que se alguma vez tivesse havido essa promessa, a lei teria de ser alterada. “O que está previsto na lei, e que são as três grandes fontes de receitas que os municípios têm, é que essas verbas vêm exclusivamente dos Orçamentos do Estado e não do Orçamento da RAM”, argumentou, mostrando-se convencido que “a Região tem razão e vai ganhar este processo” em segunda instância. Relativamente ao facto de a Madeira já ter perdido uma primeira ação no tribunal do Funchal, Pedro Calado respondeu que o apuramento da justiça contempla que as decisões de diferentes instâncias possam ser questionadas. “Por isso é que há vários recursos que se podem interpor em tribunal. Quando vamos com um processo em tribunal, há sempre duas partes em litígio. E exatamente por não estarmos de acordo e acharmos que há fundamentação do nosso lado é que estamos a fazer o recurso da decisão tomada pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal”, alegou. E acrescentou: “a grande discussão aqui não é se eles têm direito a receber, ou não; a grande questão é a quem deve caber a responsabilidade do envio desses montantes”. Para o vice-presidente do Governo Regional, os municípios “têm direito a receber” a verba, mas essa “transferência tem de vir obrigatoriamente do Orçamento do Estado”, como aliás a Câmara Municipal do Funchal reclamou em 2009, quando eram presidente e vice-presidente da autarquia Miguel Albuquerque e Pedro Calado, respetivamente.
“Se calhar, o que o tribunal também queria era que depois fosse o Governo Regional a meter um outro processo contra o Estado português para ver compensada a transferência que tinha feito para a Câmara do Funchal, mas nós achamos que não temos de estar a fazer adiantamentos de verbas nem pagamentos de montantes”, realçou. O vice-presidente advertiu, por fim, que nesta matéria o Governo Regional está a ser preterido de duas formas. “Não só não recebe os 100% de IRS, como deveria receber, como ainda lhe é retido 5% com o intuito de fazer com que o Governo Regional transfira esses montantes para as autarquias”.