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Feb 22, 2021 - 7 minute read

Ensino à distância tem enviado alunos “perdidos” para a explicação

O negócio das explicações para estudantes tem sentido os efeitos da pandemia. Se, por um lado, há quem note uma diminuição na procura, como é o caso do professor Tibúrcio Azevedo, há quem sinta, como é o exemplo de Helena Rodrigues, que os alunos têm recorrido mais a esta ajuda extra, por sentirem que não estão a render devidamente com as aulas online, ou porque os pais receiam que os filhos não estão a aprender como deveriam. Estas duas realidades são explanadas ao JM pelos referidos profissionais. Tibúrcio Azevedo trabalha individualmente no ramo há cerca de 40 anos, desta feita à frente da Explimatibu - Explicações de Matemática, e neste segundo período do ano letivo, com o fecho das escolas e ensino à distância, notou uma quebra de 40%, no universo de cerca de 100 jovens do ensino secundário a quem dá apoio.

“Há alunos que ou têm receio (apesar de termos todos os cuidados que se exigem) ou até problemas de ordem financeira”, disse, ressalvando que não explora os motivos pela saída dos estudantes das suas explicações, que são presenciais. “Dar online não é funcional”, considerou. “Estamos a trabalhar a um ritmo normal, seguindo mais ou menos o programa como se estivesse a haver aulas presenciais”.

De qualquer modo, apesar de ter perdido alunos neste segundo período, disse que recebeu também mais de dez jovens que procuraram por explicações por causa da pandemia e do ensino à distância, que revelavam muitas dificuldades.

Tibúrcio Azevedo admitiu, por outro lado, que compreende os receios dos alunos e dos pais em serem dadas aulas presenciais durante a pandemia, mas realça que a sala onde dá as explicações é grande e consegue ser mantido o distanciamento social. “Eu também estou exposto, mas é preciso ir à luta com os devidos cuidados”, disse, comentando que o trabalho presencial é feito não só pelo próprio, como por vários profissionais de diferentes ramos de atividade. “Não podemos nos encolher. Temos de trabalhar”, frisou.

Por outro lado, o explicador tem a noção que “a grande maioria dos alunos, cerca de 80% prefere as aulas presenciais, mas quando não há essa possibilidade, o ensino online é uma saída. É melhor do que nada”. No entanto, Tibúrcio Azevedo considerou que o ensino à distância não permite, muitas vezes, “uma verdadeira sintonia entre o professor e o aluno”, já que não consegue perceber se o aluno está a apreender a matéria. “Em formato presencial, mesmo de costas para eles conseguimos perceber se eles estão a compreender ou não”.

Tibúrcio Azevedo revelou ao JM que, desde que começou o ensino online, no ano letivo passado, recebeu alunos com notas muito baixas. “De 1 a 20 valores, recebi uns seis ou sete alunos que tiveram nota 6 em matemática”. Isto para dizer que notou que os estudantes sentiram mais dificuldades com as aulas online, o que se refletiu não só nas notas como também na aquisição de competências.

Já Helena Rodrigues que, com outros quatro colegas, faz parte do Centro de Explicações ‘Stop Negas’, de várias disciplinas, disse que tem sido notória uma maior procura principalmente por parte dos encarregados de educação, que receiam que os filhos não estejam a ser devidamente preparados com o ensino à distância. “É muito superior” à verificada no ano letivo passado, quando o ensino passou a ser à distância, em março, disse.

Segundo a professora, os pais que têm os filhos no 3º ciclo do ensino básico e no secundário (atualmente no formato de ensino à distância) “estão muito mais preocupados com a situação pelo que não sabem durante quanto tempo os alunos terão de ficar em casa”, entendem que como estão sozinhos, não trabalham como deveriam, não se mantêm tão atentos olhando para um computador do que para o professor na sala de aulas, nomeadamente. Neste segundo período, os encarregados de educação e alguns alunos sentem-se “mais perdidos”, expôs.

Helena Rodrigues nota que a procura pelas explicações, que continuam a ser em formato presencial, na grande maioria dos casos, tem mudado também de ‘figurino’. Ou seja, se antes da pandemia ou do ensino à distância, “a explicação era pretendida no sentido de no sentido de ajudarmos nas tarefas”, atualmente, “nós temos de praticamente dar a aula também, porque os alunos confessam que não percebem o que o professor disse, nem têm possibilidade de passar a matéria para o caderno como nas aulas presenciais”.

Não tirando o mérito aos docentes que se encontram em teletrabalho, a responsável pelo centro de explicações ‘Stop Negas’ referiu que, nos dias que correm, as horas para a explicação têm sido para “voltar a dar a matéria” dada pelo colega a partir do computador. “Antes, era um trabalho mais prático, de consolidação” das competências adquiridas em contexto de escola.

“Os miúdos chegam à explicação e dizem-nos que não perceberam praticamente nada do que o professor falou. Muitos queixam-se que as ligações são péssimas, outros porque não conseguem ouvir muito bem. Nós acabamos por ter de fazer um trabalho que a colega já fez da melhor maneira que podia. Mas é diferente ter dois alunos connosco e o professor ter 25 num computador”, reconheceu Helena Rodrigues.

Tal como Tibúrcio Azevedo, esta explicadora entende que, apesar da incógnita relativamente ao formato de ensino no terceiro período do ano letivo, haverá muitos alunos a procurarem a explicação, principalmente do 9º ano e do secundário, por causa das provas finais e exames nacionais. Independentemente da pandemia, há sempre mais procura no último trimestre do ano letivo, explicou ainda.

Os explicadores consideram que deveria haver regras melhor definidas e uniformes para a avaliação dos alunos. Uma opinião que também já foi partilhada com o JM pelos sindicatos dos professores, embora as escolas e a Secretaria Regional de Educação considerem que o processo avaliativo dos alunos é da competência de cada estabelecimento de ensino, dentro da sua autonomia.

Na opinião de Tibúrcio Azevedo e de Helena Rodrigues, as indefinições que têm havido nestes processos, a disparidade entre o seguido por um professor ou por outro, por um estabelecimento de ensino ou por outro, deveriam ser corrigidas a bem não só dos alunos como do próprio Ensino.

Tibúrcio Azevedo, que lembrou que já foi decidido pelo Governo Regional que o ensino à distância vai se manter até à Páscoa, disse que muitos estudantes não sabem como serão avaliados, “se será com a nota do primeiro período, ou se só passam de ano com a nota do primeiro e do terceiro períodos. Não sei como vão fazer isso”, reconheceu.

O professor entende que a avaliação online não resulta. Os alunos “fazem uma ‘fichinha’ ou outra”, mas não são devidamente avaliados. O explicador não tem dúvidas que “o aluno é prejudicado” neste processo, apesar de, no ano letivo passado, ter sido beneficiado nas notas (o que não significa que o tenha sido na sua formação). “A partir do momento, em que viram que não ia haver mais aulas presenciais, a ordem foi para inflacionar as notas”.

“Chegou-se a uma altura em que as notas foram de quem está com 2 ou 2,5 de nota, passou para o três (o que dá para passar)”. A seu ver, no ano passado as escolas “passaram alunos de ano de olhos fechados”. A seu ver, “não se pode continuar assim durante muito tempo, pelo menos apenas mais um ano, porque senão, o nosso ensino vai regredir muito”. Tibúrcio Azevedo entende que tenha havido alguma inflação nas notas para não prejudicar os alunos, contudo, “foi demais”.

Helena Rodrigues é da mesma opinião. Aliás, disse que atualmente a avaliação dos alunos é de extremos, com docentes que “não fazem qualquer tipo de avaliação” e outros com “um nível de avaliação muito superior ao que já fizeram em aulas presenciais. Vejo extremos, não vejo nada uniforme”, comentou, defendendo que entre as escolas e a Secretaria Regional de Educação deveriam ser definidas linhas orientadoras para o bem dos alunos e dos próprios docentes, que também não querem falhar. Com efeito, nota, junto dos jovens a quem dá explicações, que está a haver situações com défice de avaliação e outras em que há uma exigência muito grande em cima dos alunos. Estes também sentem que a carga de tarefas aumentou, em muitos casos.

“Daí os pais socorrerem-se de nós, pedem ajuda, porque não conseguem acompanhar os filhos e trabalhar. Pedem para fazermos as tarefas com os miúdos e para orientarmos todo o trabalho que vai sendo feito para ver se aprendem qualquer coisa”. A concluir, Helena Rodrigues referiu que “antes, a explicação era para os alunos terem boa nota nos testes, agora a explicação é para orientar todo o trabalho e que o aluno adquira as competências que lhe são pedidas. A explicação é para eles aprenderem”.