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Apr 27, 2021 - 3 minute read

Cardeal Tolentino Mendonça relembra: “Todos estamos nas mãos uns dos outros”

Foi com uma mensagem carregada de esperança, mas também de desafios lançados à humanidade que o Cardeal Tolentino Mendonça abriu, esta manhã, a Cimeira das Regiões de Saúde 2021, que terá entre hoje e amanhã no Colégio dos Jesuítas, no Funchal. A partir de Itália, o teólogo madeirense começou, inevitavelmente, por falar desta pandemia e da forma como esta apanhou o mundo de surpresa.

“Temos de reconhecer que esta pandemia apanhou as nossas sociedades impreparadas e não falo sobretudo do ponto de vista sanitário. Falo do ponto de vista da nossa experiência e daquilo que a nossa memória pode extrair em nosso socorro. Falo da nossa visão do mundo e da existência. Do que julgamos distante e do que está efetivamente perto”, disse na ocasião, reconhecendo que “não é fácil, repentinamente, constatar que sabemos de nós próprios e da vida muito menos do que pensávamos”.

“Não é fácil despertar dentro de um mundo desconhecido”, sustentou, citando um escritor italiano que “há uns dias atrás recordava que a nossa geração tem sido uma ‘juventude dourada’ na história europeia, em que todas as coisas más, que na verdade nunca deixaram de acontecer, aconteciam, porém, lá longe e aos outros. Eram tragédias que assistíamos pela televisão, em diferido, e nem nos dávamos conta que a perceção que construíamos das nossas sociedades no fundo correspondia a uma humanidade com mais saúde, com mais esperança de vida, com mais segurança e proteção”.

Agora a situação é outra e está entre nós.

Esta visão, assente num contexto histórico, “veio mostrar que não é tão inabalável como nós pensávamos”, frisou.

Aliás, embora pareça um paradoxo, Tolentino Mendonça disse que “este tempo de crise, com as dificuldades que todos conhecemos, representa também uma oportunidade para nos reencontrarmos”.

Considerou que a experiência deste confinamento tem ajudado ao Homem compreender melhor o que significa ser uma comunidade.

Disse que hoje em dia que passamos a compreender melhor que a nossa vida não depende apenas de nós e das nossas escolhas. “Todos estamos nas mãos uns dos outros”, lembrou.

Recordou que os cuidados individuais que somos chamados a exercitar não são reflexo de um individualismo, mas sim a nossa forma de colaborar para uma “construção maior”.

“Esta é a hora em que podemos reaprender tantas coisas”, afirmou, explicando que, para além de cuidarmos de nós, é preciso olharmos “para o nosso sítio, o nosso bairro, a nossa cidade, a nossa região e o nosso país”.

Apelando ao encorajamento, à hospitalidade e a saber-se “olhar o outro” não como desconhecidos, mas como alguém como nós, o cardeal lançou ainda o desafio para que saibamos aceitar a mudança.

“A pandemia parece o apocalipse, mas não nos esqueçamos que todo o apocalipse é uma revelação”, declarou na sua intervenção.

Sobre o crescente aparecimento de novas epidemias, Tolentino Mendonça referiu que o ser humano, por conta dos novos modelos de desenvolvimento, tem mostrado “pouco respeito pela casa comum” e tem “atuado no mundo” como se estivesse sozinho no planeta, esquecendo que partilha, “com outras criaturas, ambientes e potencialidades”.

No seu discurso, o também poeta deixou ainda uma palavra de apreço a todos os profissionais de saúde que, com a sua dedicação, têm “inspirado o arranque de um tempo novo” e têm dado um “testemunho altíssimo”.

“Esses são os heróis desta história coletiva. E são milhões que, de forma anónima e com um extraordinário sentido de abnegação continuaram a manter abertos os serviços (…) e nos hospitais a combater por todos nós na primeira linha”.