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Feb 25, 2021 - 7 minute read

Ansiedade e desânimo atingem utentes com deficiência internados

No início da pandemia, foi vedado no Lar Residencial do Centro de Inclusão Social da Madeira (CISM)- estrutura de apoio a pessoas adultas com deficiência, o acesso às visitas e as idas a casa de familiares aos fins de semana. Contudo, mais tarde, “na salvaguarda dos laços familiares e dada a instabilidade emocional que se começou a revelar nos utentes”, foram permitidas algumas visitas “com os devidos distanciamentos e com as medidas de proteção preconizadas para o efeito”, como explicou ao JM a diretora do Departamento de Inclusão da Pessoa com Deficiência, Ana Sousa, lembrando que, neste momento, e já a partir do final do ano transato, as visitas foram novamente totalmente suspensas.

Questionada acerca do impacto desta medida, Ana Sousa começa por revelar que, “naturalmente, surgiram sentimentos de incerteza e medo relativos à exposição ao vírus”.

No entanto, ressalva, “desde o primeiro momento, em março de 2020, as equipas que integram o Lar Residencial e os Centros de Atividades Ocupacionais (CAO), reorganizaram-se de modo a acompanhar todos os utentes e famílias, promovendo o apoio necessário e possível, no processo de ajustamento e compreensão da nova realidade”.

Face às restrições impostas pelos planos de contingência, e no que respeita aos residentes do Lar, a diretora diz que é notório “um aumento dos níveis de ansiedade e algum desânimo nos utentes” dado que a sua rotina foi “completamente alterada, não podendo usufruir das suas idas ao café, passeios ao fim de semana e idas ao Funchal”.

“Além de estarem privados de todas estas atividades, não podem ter contato regular com os familiares, nem irem a casa aos fins de semana como acontecia”, recorda, salientando que “toda esta conjuntura tem influência na gestão comportamental e emocional destes utentes, com consequências na capacidade de autogestão de sentimentos”.

Atendendo aos diferentes graus de incapacidade, Ana Sousa adianta ainda que alguns utentes “têm a noção do perigo da doença e tomam as devidas precauções para se protegerem”. No entanto, “existem outros que não têm essa noção e não têm a capacidade de se protegerem, necessitando de apoio e supervisão permanentes”.

No que aos centros de atividades ocupacionais (CAO) diz respeito, a responsável destaca que todo o acompanhamento e orientação disponibilizada logo após o encerramento das atividades, “foi crucial para atenuar os efeitos de eventuais medos, bem como para manter as rotinas diárias ajustadas a cada utente e contextualizadas com o meio familiar que estes integram, preparando-os gradualmente para o contexto”

Aliás, no presente, afiança, a maioria dos utentes compreende e tem noção do momento em que vivemos e até já integram “com naturalidade” comportamentos de prevenção e medidas de segurança.

 

Rotinas mantidas à distância

Sobre o trabalho que tem sido desenvolvido pelos serviços para minimizar o impacto da covid-19, Ana Sousa explica ainda que, “não obstante o encerramento dos CAO, foi assegurado, nas situações que se revelaram necessárias, planos de atividades ocupacionais à distância, de modo a encontrar as respostas mais adequadas, estabelecendo canais de comunicação, com proximidade e periodicidade regular com as famílias e utentes, adequando as tarefas e estratégias às especificidades de cada situação”.

Desde o contato regular com as famílias, de forma a prestar o acompanhamento que se revelasse necessário, à disponibilização de materiais e equipamentos adaptados, a diretora relata que as equipas multidisciplinares afetas àqueles centros, “têm vindo a desenvolver estratégias diversificadas, facultando o apoio ou orientação sócio emocional, sugestões de atividades e reforço na importância da manutenção ao nível das rotinas diárias dos utentes, em contexto familiar”.

Ana Sousa refere ainda que alguns daqueles centros mantiveram um contato regular com os utentes e famílias, através de videochamada, verificando-se, na sua generalidade, “uma grande recetividade das famílias e utentes, o que tem vindo a estreitar eventuais constrangimentos da distância física implementada pelo encerramento destas estruturas”.

E porque é “nas adversidades que se criam novas oportunidades”, a responsável salienta que “as novas dinâmicas de contato com recurso a vídeos e outros registos digitais, apresentaram resultados muito positivos” e que é, “com naturalidade”, que diz ter sido identificadas “grandes potencialidades nas estratégias digitais de intervenção e acompanhamento das famílias, no estreitar de uma eventual distância física”. Aliás, ferramentas que a direção do CISM pretende manter mesmo após a um eventual regresso à normalidade.

Já nos utentes residentes e para que o impacto da pandemia fosse o menor possível, e dado que os mesmos frequentam o Centro de Atividades Ocupacionais e Centro de Apoio à Deficiência Profunda, (serviços existentes no CISM), Ana Sousa informa que, até o passado dia 5 de fevereiro, no período diurno, houve sempre o acompanhamento dos mesmos, no que respeita à organização de atividades de ocupação e de caracter lúdico, com o objetivo de minimizar o impacto da suspensão das atividades dos CAO. Contudo, a partir do dia 8 deste mesmo mês, com a reabertura dos centros, as atividades retomaram o seu ritmo, da forma mais normalizada possível.

 

APCM esforça-se em manter a maior normalidade possível

 

Também na Associação de Paralisia Cerebral da Madeira (APCM), onde estão também utentes em regime de internato, a gestão da pandemia tem sido feita de modo a manter as rotinas na maior normalidade possível.

De acordo com a vice-presidente da direção da APCM, os utentes que ali residem têm sido até muito compreensivos, acatam as diretrizes e respeitam as regras impostas no combate a esta pandemia.

Promovemos várias ações de sensibilização aos utentes sobre a covid-19, Cristina Andrade conta que, nestas formações, estes se mostram sempre “atentos e querem sempre saber mais sobre o vírus”.

Como a natureza da patologia dos utentes desta associação (na sua maioria não autónomos), requer “um grande apoio logístico”, a responsável explica que foram mantidos os serviços já prestados, nomeadamente terapias e atividades, bem como o desporto adaptado, “com as devidas adaptações e novas exigências”.

Também as temáticas vivenciadas habitualmente na instituição têm sido de igual forma assinaladas de modo a manter uma certa normalidade ao dia a dia desta população.

E porque a boa-disposição é importante, Cristina Andrade destaca o trabalho da Rádio RITMO - acrónimo de “Rádio Interna Totalmente Maluca e Original”- a qual emite, diariamente, através de um sistema de som interno, emissões com ‘playlists’ de música e informações internas, com a ajuda de quatro utentes. Aliás, a Associação ressalva que aproveita sempre estas emissões para apelar aos cuidados a ter e a respeitar as normas de segurança.

Outro projeto levado a cabo pela APCM são os “Contadores de Histórias” com objetivo de sensibilizar para a paralisia cerebral e acessibilidades físicas nas escolas. Embora o objetivo deste projeto seja a sensibilização nas escolas, nesta época de confinamento, os utentes (que comunicam com recurso a um tablet com sistema de comunicação aumentativa e alternativa) têm contado histórias aos utentes que se encontram resguardados nos seus quartos devido à sua frágil condição de saúde.

Para “quebrar” o isolamento, também na época natalícia os utentes foram, por grupos, visitar as iluminações no centro do Funchal. Foram no transporte da instituição e passearam, dentro da carrinha, pelas ruas da cidade.

 

Tecnologia foi crucial

Fruto dos tempos modernos, Cristina Andrade não tem dúvidas que as novas tecnologias foram uma “ferramenta crucial” para minimizar a ausência.

Lembrando que a população residente na APCM, no seu maior número, apresenta patologia essencialmente motora, tendo capacidades cognitivas para acompanhar todo este processo de adaptação a esta nova realidade de pandemia, a responsável revela que alguns utentes são mais ansiosos que outros e que foi preciso recorrer à videochamada para que fosse dado acompanhamento psicológico.

Um dado também positivo é que um numero significativo de residentes usa as novas tecnologias adaptadas à sua condição motora e consegue de forma autónoma comunicar com os seus familiares e amigos.

Quanto aos restantes utentes, estes comunicam com a ajuda da APCM, fazendo as videochamadas por agendamento.

Os familiares, ressalva, “têm sido compreensivos e respeitam as normas”.